Os dados de ataques a jornalistas e veículos de imprensa são alarmantes
Por Clara Lemos
Na noite da segunda-feira (31) foi veiculado no telejornal RJ2 da rede Globo o esquema denominado “Guardiões do Crivella”, no qual funcionários da prefeitura do Rio de Janeiro faziam plantões em duplas nas portas de hospitais da capital para impedir que reportagens televisivas fossem gravadas e que a população denunciasse problemas referentes à saúde, principalmente no contexto de pandemia do novo coronavírus.
Os funcionários, que se organizavam por meio de um grupo no whatsapp, não usavam crachás para se identificarem como servidores públicos. A prefeitura do Rio alega que “[os] funcionários ficaram nas portas dos hospitais para esclarecer a população e rebater mentiras que são repetidas no noticiário da emissora".
Este não é um caso isolado de ataques à imprensa e a profissionais da comunicação. Segundo o último relatório da FENAJ (Federação Nacional dos Jornalistas) “Violência contra jornalistas e liberdade de imprensa no Brasil”, os casos de violência contra jornalistas cresceram em 50% entre 2018 e 2019, totalizando 208 casos em 2019. Os dados do relatório revelam que a região Sudeste foi onde aconteceu o maior número de casos (46,82%) e os profissionais na TV foram os mais atingidos (28,23%).
Ainda segundo o relatório, o presidente Jair Bolsonaro foi responsável por 121 desses ataques, o que corresponde a 58,17% do total. “Foram 114 ofensivas genéricas e generalizadas, além de 7 casos de agressões diretas a jornalistas, totalizando 121 ocorrências” no primeiro ano do governo de Bolsonaro. A FENAJ publicou em julho dados sobre os ataques do presidente Bolsonaro contra a imprensa e seus profissionais entre janeiro e junho de 2020. “Foram registradas 245 ocorrências de janeiro a junho de 2020, sendo 211 categorizadas como descredibilização da imprensa, 32 ataques pessoais a jornalistas e 2 ataques contra a FENAJ.”
Ainda segundo a Federação, Bolsonaro se dirige e fala sobre a imprensa, referindo-se a ela e seu trabalho com expressões como “mentirosa, omissa, sem credibilidade ou confiabilidade, afirmou que a imprensa atrapalha, é uma vergonha, deturpa, esculhamba, tripudia, que falta notícias verdadeiras, chama de fake news, que destrói reputações”, criando a narrativa da imprensa como sua “inimiga” e “inimiga do País”.
Além disso, segundo relatório da Abert- Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV, a imprensa sofreu 11 mil ataques diários nas redes sociais em 2019, contabilizando sete agressões por minuto. São dados preocupantes em um país onde o sistema de governo é a democracia e os direitos à liberdade de imprensa e de informação são assegurados pelo Capítulo V da Constituição Federal.
Frente a tanta violência contra profissionais da imprensa, a Abraji- Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo e a OAB- Ordem dos Advogados do Brasil criaram em conjunto uma cartilha que explica como jornalistas podem acionar a Justiça e seus dispositivos legais em casos de ataques e assédios online. Segundo a cartilha “o assédio online aos jornalistas interfere profundamente nas liberdades de imprensa, de expressão e no direito de exercício da profissão, bem como no direito de acesso à informação por parte do público em geral.”
Os casos de violências e tentativa de descredibilização da imprensa por parte do governo Bolsonaro e seus apoiadores chamam a atenção para o desmantelamento do estado democrático e a aproximação ao autoritarismo, forma de governo que tem como característica o controle da imprensa e meios de comunicação. O jornalismo é sobretudo um grande defensor e mantenedor da democracia, ambos possuem relação simbiótica, onde um necessita do outro para se manter e continuar existindo.
A liberdade de imprensa não é condição dada e permanente, ela precisa ser sempre alimentada e vigiada. Dados como os apresentados acima nos coloca em situação de alerta e indica que nossa democracia não vai bem, pois não é permitido, em um Estado Democrático de Direito, regido sobretudo por uma Constituição, reiterados e violentos ataques à imprensa como vem acontecendo no Brasil desde a posse do presidente Jair Bolsonaro.
Para refrescar a memória e lembrar o que diz a Constituição Federal a respeito da liberdade de imprensa, deixo aqui o Capítulo V da Constituição, sobre Comunicação Social, o artigo 220 fala que: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observando o dispositivo nesta Constituição.” No parágrafo primeiro: “Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o dispositivo no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. E, ainda, no parágrafo segundo: “É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.”
A estruturação do texto só não é mais perfeita que a jornalista mesmo