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Dia dos Pais em dobro

A celebração dessa data é ainda mais especial nas famílias formadas por pais homoafetivos. Há 5 anos a adoção homoparental é permitida no Brasil


Por Rebeca Kroll

Daniel e sua família (Seu marido Wilton à frente, seus filhos Isaac e Kevin ao fundo e seu pai à esquerda)

“Eles sempre foram nossos e nós sempre fomos deles, a gente apenas precisava se encontrar” conta Daniel do Valle Silvestre. Daniel e seu marido estão juntos há 15 anos. Em 2016 decidiram começar uma família, pouco mais de um ano depois adotaram os irmãos Isaac (11) e Kevin (7). No Brasil, o casamento homoafetivo é permitido desde 2011 e, esse ano, o reconhecimento da adoção por casais homoafetivos, chamada adoção homoparental, completou 5 anos.


O processo de adoção para casais homoafetivos é o mesmo de casais heterossexuais: envolve apresentação de documentos, entrevistas e visitas a abrigos até a aprovação final de um juiz. “Tínhamos medo que pudesse ser mais complicado, mas realmente não é, inclusive o nosso processo foi até rápido, ficamos 37 dias na fila de espera, é muito raro conhecer alguém que ficou tão pouco tempo. Não tem realmente nenhuma restrição, o judiciário não tem, as entidades também não tem, nunca sentimos nenhum problema em relação ao nosso desejo de adotar e a nossa sexualidade” relata Daniel.


O receio de que as crianças poderiam não aceitar dois pais esteve presente no casal, Daniel conta que escolheram crianças mais velhas justamente por isso, assim poderiam explicar direito e conversar. “O meu filho mais novo, quando ele tinha 5 anos ele não entendia que eram dois pais. Ele achava que era um pai pra cada um e ele queria escolher um pai pra ele, mas depois que explicamos a ele não tivemos nenhum problema com eles em relação a sermos dois pais” disse Daniel.


O preconceito contra a comunidade LGBT ainda é muito presente na sociedade brasileira. Diante disso a adoção homoparental muitas vezes não é bem vista, sendo tratada como má influência para as crianças. Entretanto, um estudo publicado pelo periódico Developmental e Behavioral Pediatrics, desenvolvido em 2018, mostrou que crianças com pais do mesmo sexo apresentam desenvolvimento psicológico e social sadio, a sexualidade dos pais não apresenta relação com as características primordiais dos jovens.


Para Daniel, muitas vezes o preconceito acontece de forma sutil, por exemplo, ao preencher documentos que pedem nome do pai e da mãe. “Isso é uma forma de preconceito, é um dificultador, um chateador. Preencher um cadastro assim pra mim é uma forma de preconceito velado. Na carteira de identidade já tem filiação e espaço para colocar os dois nomes, mas no cpf, por exemplo, não tem, você escolhe um dos pais para colocar e o nome da mãe fica desconhecido. Isso são formas que a sociedade impõe pra gente onde ela normatiza quem é que pode ser pai e mãe, normatiza que só casais heterossexuais podem ter filhos, de forma a nos dizer que nós não temos direito à paternidade” afirma Daniel.


Além dos preconceitos existentes contra as famílias homoafetivas, para Daniel há outro problema: o desconhecimento da sociedade sobre o que realmente é a adoção. “As pessoas tratam a adoção como uma forma de caridade, como se tivéssemos feito caridade para os meninos, dizem coisas como ‘vocês mudaram a vida deles’, ‘como vocês são bondosos’ e isso é algo que me incomoda bastante. Os meninos precisavam de uma família e a gente também precisava de uma família, então não fizemos nada por eles que eles não tenham feito por nós. Eu não consigo ver a adoção como uma ação benevolente, como uma caridade e sim como um encontro” diz.


Daniel também atenta ao problema da adoção no Brasil. Segundo o Cadastro Nacional de Adoção (CNA) existem cerca de 5 mil menores esperando a adoção e por volta de 42 mil famílias na fila de espera de adoção. Isso acontece devido a procura somente por crianças pequenas ou por perfis específicos de crianças; por exemplo, de acordo com o CNA 65% das famílias interessadas em adotar não querem crianças com irmãos e das 5 mil crianças disponíveis cerca de apenas 30% atendem esse critério.


“Famílias interraciais, LGBT, de pai ou mãe solo, essas famílias já conhecem uma realidade diferente e talvez se as famílias LGBTs não tivessem os entraves sociais de preconceito, se tivessem formas mais simplificadas de normalizar as famílias diferentes poderiam ter pessoas nas filas de adoção que busquem perfis de crianças reais, perfis de crianças que estão em abrigos. Vários amigos que falam da nossa coragem de adotar, não querem dizer sobre a coragem de ter dois filhos, mas da coragem de se impor e não ter medo do preconceito. Muitos casais LGBT querem ter filhos, mas muitos não tem ânimo de fazer essa batalha contra o preconceito do mundo” lamenta Daniel.


Como pai, Daniel conta estar muito ansioso para o dia dos pais, a data é ainda mais especial aos pais homoafetivos que tem o dobro de motivos para comemorar. Esse ano pela primeira vez Daniel irá comemorar a data com seu pai e seus filhos. “A gente está muito feliz, meu pai sempre foi um paizão, sempre foi um pai muito bom. Agora estamos com o meu pai, dando a oportunidade dos meus filhos conhecerem melhor ele e ele conhecer melhor as crianças, passando o primeiro dia dos pais todos juntos, está sendo muito especial” conta.


Para ele o grande desafio de ser pai é deixar pessoas melhores para o mundo, fazer com que os filhos se tornem pessoas boas, justas e conscientes. “É ajudar a formar um bom ser humano, esse é o maior desafio.”


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