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  • Yngrid Alves

A disparidade entre o protagonismo branco e preto no Dia Internacional da Mulher

Já dizia a ativista negra Djamila Ribeiro: “Enquanto àquela época mulheres brancas lutavam pelo direito ao voto e ao trabalho, mulheres negras lutavam para ser consideradas pessoas”

Foto: Google Imagens/Reprodução

No dia 8 de março é celebrado o Dia Internacional da Mulher, figura esta que foi protagonista em diversos protestos e lutas contra a opressão de gênero. A homenagem foi estabelecida depois de um incêndio ocorrido no dia 25 de março de 1911 em Nova York, no Triangle Shirtwaist Company. A tragédia vitimou 146 pessoas, sendo 125 mulheres e 21 homens, que, no dia, estavam trancados na fábrica. Na época, proprietários de fábricas costumavam trancar seus funcionários no interior do recinto para impedir greves e motins.

O incêndio foi provocado pela precariedade das instalações elétricas somada à grande quantidade de tecido presente no estabelecimento. Ademais, durante a Revolução Russa em 1917, manifestações conduzidas pelas operárias reivindicando direitos políticos e melhores condições de trabalho marcaram a época. No dia 08 de março desse mesmo ano, cerca de 90 mil trabalhadoras russas percorreram as ruas clamando tais direitos. Esse marco histórico foi determinante para decretar essa homenagem às mulheres e potencializar a causa.

A luta feminina operária foi um fator triunfante e estimulante aos movimentos feministas em ascensão na época. Mulheres se uniram em busca de seus direitos como trabalhadoras e, sobretudo, mulher. Entretanto, o que é pouco falado em todo dia 8 de março é sobre a ausência da mulher negra nesse combate, e que além disso, hoje em dia também carecem de protagonismo uma vez que o assunto é feminismo.

Essa desigualdade, todavia, já é percebida e criticada por ativistas negras como Djamila Ribeiro. A filósofa e escritora destaca que a mulher preta é o principal alvo da desumanização da sociedade. Ela ainda afirma que ‘enquanto àquela época mulheres brancas lutavam pelo direito ao voto e ao trabalho, mulheres negras lutavam para ser consideradas pessoas’.

Seguindo o pensamento da escritora, o feminismo negro ganhava voz principalmente com Sojourner Truth, uma ex-escrava que se tornou oradora, ao trazer uma reflexão importante com o seguinte questionamento: “E não sou eu uma mulher?”. Ela aponta a disparidade entre a visão de mulher preta e de mulher branca uma vez que o estereótipo de ‘sexo frágil’ apenas se aplicava às brancas, pois as negras não eram frágeis e tampouco delicadas o suficiente para escaparem das chibatadas.

Laís Moreira de Oliveira, professora de Química, mãe e mulher preta cis, mestranda em ciências sociais e ciberativista da Somos as Netas das Negras, acrescenta à discussão o fato de mulheres negras não serem vistas como dignas de afeto. Segundo ela, essa negação contribui para a desumanização das mesmas, que são as mais hiperssexualizadas. Dessa forma, a docente explica que existe um condicionamento para a existência de uma figura feminina na sociedade, e ele não conta com os corpos negros.

Além disso, a ciberativista ressalta também a invisibilidade da mulher negra nos mais variados espaços. “As mulheres negras são invisibilizadas na ciência, nas relações afetivas, na produção de conteúdo, no processo acadêmico [...] não é um espaço pensado para nós, a gente precisa se redobrar de cuidados e conhecimento para que respaldem a nossa existência e localidade”.

Nesse sentido, deve-se refletir e admitir que o Dia Internacional da Mulher não representa e tampouco inclui ou conta a história de luta e opressão da mulher negra. Nas mídias e redes sociais, as homenagens prestadas às mulheres quase não contam com a presença de mulheres pretas e seus feitos. Está enraizado na sociedade o estereótipo quando se pensa em ‘mulher’: branca.

O dia das pretas


No dia 25 de julho é comemorado o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. Nesta data, de fato, é celebrada e enaltecida a resistência das mulheres pretas contra as opressões sociais que as atingem e seus feitos históricos. Por terem suas causas ignoradas dentro do feminismo branco, há de se fazer um recorte racial e dar uma maior atenção àquelas que, além de sofrerem com o machismo, sofrem com o racismo.

No Brasil, a data é comemorada junto ao Dia Nacional da Mulher Negra e de Tereza Benguela. Ela foi uma líder quilombola de destaque que resistiu à escravidão durante duas décadas no século XVIII, lutando pela comunidade negra e indígena que vivia sob sua liderança.

A homenagem existe não somente por conta da invisibilidade de mulheres pretas no dia 8 de março, mas também porque segundo a ONU, dos 25 países com os maiores índices de feminicídio do mundo, 15 ficam na América Latina e no Caribe, sendo em sua maioria de mulheres negras. Além disso, de acordo com o mapa da violência, a vitimização entre as mulheres negras no Brasil cresceu 54,2%, enquanto o homicídio das brancas caiu 9,8%.

Nesse contexto, a luta delas é contínua até que tais números não tenham disparidade e tampouco existam. A necessidade do antirracismo em qualquer vertente de causas sociais tem de ser discutida e tornar-se prioridade. Em concordância a isso, a ciberativista conclui: “Pensar em ruptura de opressão, desmantelamento de um sistema patriarcal e misógino, sem pensar na mulher preta, é não mover em nada a estrutura das opressões”.


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