Essa “mãe que também é pai” carrega sozinha a responsabilidade de uma vida
De fato, a maternidade é transformadora em diversos aspectos da vida de uma mulher. Mas será que é sempre de maneira positiva? Sua romantização é um grande equívoco, pois desconsidera as vivências reais passadas pelas mulheres. É necessário reconhecer que as experiências maternas são singulares, cada mãe está incluída num contexto social e familiar diferente; possui uma história, medos, traumas, ou seja, infinitas particularidades. Uma mulher que convive com o pai dos filhos não terá muitas das dificuldades de uma mãe solo, por exemplo.
Mãe “solo”?
Você deve estar se perguntando: “Por que não mãe solteira?”. Esta expressão, ainda que de forma despercebida, carrega um significado negativo e machista. O adjetivo “solteira” era empregado para desqualificar, menosprezar e envergonhar estas mães pelo fato de não terem um companheiro. Em oposição, está o termo “mãe solo”, que refere-se a mulheres que são as únicas ou principais responsáveis pelos seus filhos. Mas apesar de estar se popularizando, ainda é mais comum encontrá-lo em páginas da web sobre maternidade, onde há troca de experiências e apoio entre elas.
“Você é mais do que mãe. Você tem que estar presente, tem que suprir os sentimentos dos seus filhos. Não só cuidar, dar atenção e carinho, como também prover o lar" - Priscila Martins (36), advogada e mãe de gêmeas, diz sobre ser mãe solo.
Desde que se tornou mãe, aos 17 anos, Priscila teve que sustentar as filhas Lisandra e Lisanny. “O genitor das minhas filhas nunca contribuiu para o sustento delas. Então, a partir daí, eu me vi como provedora e sempre trabalhei. Desde quando tinham três meses de vida, eu comecei a trabalhar e batalhar. Eu trabalhei muito em diversos lugares e também fiz a minha faculdade inteira durante a infância delas”, ela relata.
“Não usarei a palavra pai porque ele nunca foi um” - Priscila pontua.
Ausência paterna é um caso frequente quando há separação dos pais da criança. Geralmente, a responsabilidade da criação recai inteiramente sobre a mãe, que acaba abrindo mão de suas individualidades e sonhos. Ela se vê cobrada socialmente a dar conta de tudo sozinha e sem cometer erros. Sendo assim, a mãe solo sofre uma pressão social de criar bem os filhos de forma mais intensa. Enquanto isso, na maioria das vezes, a presença do pai e suas obrigações não são requeridas pela sociedade.
A advogada ressalta a importância de ter tido uma rede de apoio, seus pais, que ajudaram-na a cuidar das gêmeas não só tomando conta, mas também fornecendo auxílio financeiro. Isto a possibilitou concluir seus estudos e trabalhar ao mesmo tempo. “Eu não podia mais ficar na minha zona de conforto, precisava melhorar como pessoa, ter uma profissão que me ajudasse a suprir as necessidades das minhas filhas e poder dá-las tudo que sempre quis”, ela explica.
Hoje, pós-graduada em direito civil e em direito médico, ela reconhece a importância da participação deles em sua trajetória. Infelizmente, muitas mulheres não têm o mesmo privilégio de ter assistência em suas jornadas e precisam lidar com diversas questões sozinhas, como atitudes discriminatórias de outros indivíduos.
Por não estarem incluídas no padrão considerado “tradicional” - mãe, pai e filhos -, as famílias de mães solo são classificadas como incapazes de conceder uma boa instrução aos menores. Priscila rebate essa ideia: “O fato da mulher ser mãe solo e não ter uma figura paterna ao seu lado nada tem a ver com a ausência de educação, uma vez que toda mulher pode ser capaz de dar uma boa criação para seus filhos”, defende.
““Nossa, você acabou com a sua vida!”, eu escutava. Como se dar a luz fosse algo ilícito ou proibido” - Priscila comenta.
A frase acima é um exemplo infeliz de algo para se dizer a uma mãe. “A gravidez é a fase em que a mulher está mais frágil e precisa de apoio e solidariedade", destaca. Por ter engravidado muito jovem, Priscila afirma ter escutado várias falas maldosas.
“Até meus amigos se afastaram de mim, naquela época, porque achavam que eu não era uma boa companhia”, conta. A gravidez na adolescência ainda é relacionada a uma falha moral. Mas, na verdade, esta é uma consequência da desinformação e da falta de educação sexual no período de descoberta da sexualidade.
“Os comentários maldosos se tornam incentivos à nós mães para sermos as melhores que podemos ser”, ela rebate e ainda acrescenta: “Na verdade, o que falta no ser humano é empatia e amor ao próximo. E, no que toca às mulheres que estão passando pelo que eu passei, ser mãe é um ato de coragem!”.
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