Pesquisa brasileira sugere correlação inversa entre casos de dengue e Covid-19
- Ana Modesto
- 23 de set. de 2020
- 5 min de leitura
O estudo encontra em sua fase inicial e ainda será publicada em revistas científicas

Nesta segunda feira (21), pesquisa brasileira que ainda está em sua fase inicial aponta que as regiões em que parcela da população que contraiu a dengue em 2019 e início de 2020 tanto obtiveram maior dificuldade em adquirir a transmissão comunitária da Covid-19, e também registraram menores casos de contágio e de mortes provenientes do novo vírus. Desta forma segundo estudo liderado pelo cientista brasileiro Miguel Nicolelis, é viável perceber uma interação imunológica entre o vírus do novo Coronavírus e o da dengue, mesmo que sejam de famílias completamente distintas.
A imagem abaixo ilustra a distribuição geográfica de a incidência de casos de Covid-19 até 30 de junho de 2020 e com também a incidência de casos de dengue até 31 de maio de 2020.

Segundo Nicolelis, professor catedrático da Universidade Duke, na Carolina do Norte, que dedica o seu tempo de estudo voltado ao comportamento da Covid-19 no território brasileiro desde o início da pandemia, relata que existe chances de vacinas em desenvolvimento e já aprovadas de trazerem tem alguma imunidade contra o novo coronavírus.
Estudo feito com exclusividade pela Reuters relata sobre:
“Essa descoberta surpreendente levanta a intrigante possibilidade de uma reação cruzada entre o vírus da dengue e o SARS-CoV-2. Se comprovada correta em futuros estudos, esta hipótese pode significar que a infecção pela dengue ou uma eventual imunização com uma vacina eficaz e segura para dengue poderia produzir algum tipo de proteção imunológica para SARS-CoV-2, antes de uma vacina para SARS-CoV-2 se tornar disponível”. Estudos posteriormente serão enviados e publicados em revistas científicas.
Pesquisador responsável pelo estudo salienta já existirem trabalhos que ilustram um cenário de pessoas com sorologia positiva para dengue e para coronavírus sem estar contaminado com a Covid-19, sugerindo assim a possibilidade de produção de anticorpos contrários às duas doenças nessas pessoas.
“Isso indica que existe uma interação imunológica entre os dois vírus que ninguém poderia esperar, porque os dois vírus são de famílias completamente diferentes”, disse o pesquisador
O estudo ainda indica uma correlação negativa entre incidência, mortalidade e taxa de crescimento do novo coronavírus e que parcela da população com anticorpos IgM para dengue no Brasil. O território brasileiro é o terceiro em número de casos de Covid-19 no mundo e o segundo maior número de mortes.
Esta observação foi feita por Nicolelis e sua equipe durante o estudo sobre a disseminação geográfica da Covid-19 no Brasil e a influência das rodovias como fator de disseminação. Em uma entrevista à Reuters, o pesquisador afirma sobre a sua descoberta:
"Eu peguei o mapa de casos de coronavírus e coloquei lado a lado com o mapa de dengue, e encontrei o que a gente chama de distribuição complementar: regiões com pouco coronavírus estão cheias de dengue".
O cientista pesquisador, após analisar que havia vazios de casos no mapa sem uma explicação aparente, começa outro estudo em busca de respostas. Segundo Nicolelis, a resposta apareceu na análise da distribuição geográfica dos casos de dengue no Brasil de 2019 a 2020. Essas informações acabavam com os buracos do mapa de casos da Covid-19. A proximidade das curvas de casos das duas doenças enfatizam os resultados, logo que as duas doenças entraram em declive no Brasil no mesmo momento. Nicolelis declara sobre a sua surpresa com a descoberta nas seguintes falas:
“Foi um choque, foi um acidente total. Em ciência isso acontece, você está atirando para um lado e acerta no alvo que você nunca imaginou que iria atirar”;
“Fui olhar no Ministério da Saúde se tinha alguma explicação para essas coisas estranhas, se tinham outros indicadores de doenças que eu não estava percebendo, e de repente encontro o mapa de dengue de 2020 do Brasil. Eu peguei o mapa de casos de coronavírus e coloquei lado a lado com o mapa de dengue, e encontrei o que a gente chama de distribuição complementar: regiões com pouco coronavírus estão cheias de dengue.”
Os estados mais afetados pela dengue no ano de 2019 ao início de 2020 e obtiveram maior período da transmissão comunitária de Covid-19 foram:
Paraná
Santa Catarina
Rio Grande do Sul
Mato Grosso do Sul
Minas Gerais
Enquanto os estados do Amapá, Maranhão e Pará, que obtiveram baixa índices da dengue neste mesmo período levaram pouco tempo para ter uma transmissão comunitária de Covid-19.
“Quando a incidência de Covid-19 versus a incidência de dengue em 2019-2020 foi plotada para esses países, nós novamente obtivemos uma significativa correlação inversa exponencial. Em outras palavras, quanto mais casos de dengue um país teve durante a epidemia mundial de dengue em 2019 e nos primeiros meses de 2020, menos casos de Covid-19 o país registrou até julho de 2020. Basicamente, isso foi muito similar aos resultado obtidos usando dados para os Estados brasileiros”, diz estudo
O estudo ainda alerta sobre as regiões que possuem alta incidência de dengue e uma a alta densidade demográfica também podem sofrer de surtos da covid-19. Nicolelis relembra que a pesquisa é uma análise epidemiológica, mas qualquer estudo sorológico, e relata sobre na seguinte fala:
“Os nossos resultados epidemiológicos sugerem a hipótese, que ainda precisa ser testada amplamente, que o SARS-CoV-2 compete com o vírus da dengue pelas mesmas pessoas, pelo mesmo pool de suscetíveis. Como o SARS-CoV-2 é transmitido homem-homem, ele teria uma grande vantagem para ganhar esta competição, em relação à dengue, que depende de um mosquito”.
Segundo informações dos casos de dengue no Brasil do Ministério da Saúde revela que o ano inicia em ritmo muito mais acelerado do que em 2019, onde possuíam uma significativa queda a partir da semana epidemiológica de número 11(até 13 de março), no instante em que há uma aceleração dos casos de Covid-19. O surto de dengue se encerrava semanas antes do que em 2019, enquanto o novo coronavírus ganhava força. O pesquisador ainda relata mais os casos de dengue, atenuando os casos de subnotificados declarados por autoridades.
“Ainda de acordo com a nossa hipótese, à medida que o coronavírus se espalhou mais rapidamente e infectou mais gente, sobrariam menos pessoas para serem contaminadas pelo vírus da dengue, e isso poderia explicar a queda repentina da curva de dengue este ano que ocorreu em todo o mundo”, disse.
Para uma maior comprovação de sua pesquisa, segundo o cientista, mesmo quando a sua análise foi feita em outros 15 países da América Latina, os resultados não se alteraram. E ele também cita cidades com altitudes superiores a 2.000m, onde não existe o mosquito transmissor da dengue e mesmo assim são locais com grande incidência de casos de Covid-19.
O estudo também comparou dados do novo coronavírus com as estatísticas da chikungunya (outra doença causada pelo mosquito Aedes aegypti para ter uma outra forma de controle. Cientista ainda afirma que antes mesmo de sua pesquisa, outros estudos já indicavam a possibilidade de paciente positivos para Dengue testarem positivo para coronavírus sem ter, de fato, Covid-19.
Nicolelis defende o estudo como busca para possíveis ideias do combate ao novo coronavírus, ainda que hoje não haja uma solução definitiva. E ainda relata sobre nas seguintes falas:
“Evidentemente que este é um estudo preliminar do ponto de vista do que fazer, mas ele abre uma porta que pode ser rapidamente explorada, e se ela for verdadeira, você pode ter um grau de proteção para coronavírus se você teve dengue ou se você é imunizado para dengue. Eu não sei dizer qual é a porcentagem, mas ela é suficiente para aparecer nesses gráficos. Alguma coisa existe”;
“Se estudos imunológicos confirmarem nossos dados epidemiológicos, esta pode ser uma luz de esperança no combate à Covid-19, porque os nossos resultados para o Brasil e 71 outros países da América Latina, Caribe, África e Ásia sugerem que existe uma reação cruzada inversa entre SARS-CoV- 2 e o vírus da dengue. Nossos estudos epidemiológicos mostram que onde houve muita dengue no Brasil em 2019-2020, a incidência de casos e mortes e a velocidade de crescimento das infecções por coronavírus foram bem menores. Possivelmente, isso explicaria o atraso da pandemia de Covid-19 na região Centro-Oeste, no Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, no oeste do Paraná, Santa Catarina, interior de Minas Gerais e Bahia, onde houve muita dengue em 2019-20. Se resultados forem confirmados, é a maior descoberta da minha carreira de 38 anos”.
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